Sentimentos e rito litúrgico

Diversas comunidades cristãs celebraram o Domingo de Ramos nesse último dia 09 de abril. Antes de presidir a celebração eucarística tive a oportunidade de assistir uma missa pela TV. Percebi que as pessoas, como também o presidente da celebração, alegres faziam a procissão de ramos. E esse clima de alegria, ao menos expressos nas faces, permaneceu durante praticamente toda a celebração. Também, observando as redes sociais, constatei a mesma situação. Dessas observadas, apenas a imagem do Papa Francisco diferiam das demais. Francisco tinha o rosto mais meditativo e concentrado.

 Claro que não queremos aqui fazer uma generalização, mas apenas apontar para algo estranho nessas celebrações: que é a ‘aparente’ alegria que muitos expressavam. Dizemos ‘aparência’, pois o contexto litúrgico não favorecia tal sentimento. As leituras, com exceção do Evangelho do início, eram fortes na negação da Boa Nova pelos líderes religiosos da época como também pelos discípulos que ainda não compreendiam bem a mensagem de Jesus. O contexto era de decepção, tristeza, angústia, traição e abandono.

Poderíamos assim dizer que existe na celebração do Domingo de Ramos um caminho descendente que vai da alegria à angústia. Da recepção de Jesus a sua rejeição. Porém, nem todos parecem adentrar em tal estado. Como se o rito celebrado não fosse mais compreensível – queremos dizer: ‘vivido’. Por que isso acontece?

Primeiramente devemos dizer o mais óbvio: as pessoas não estão celebrando, pois as mesmas não entendem o que está ocorrendo. Aqui se encontra tantos fieis leigos como muitos clérigos que querem fazer do Domingo de Ramos um dia de Festa. Por ser ‘festa’, não se pode ter tristeza. Porém, esse dia rezado devia nos colocar em certa angústia que a reflexão nos levaria ‘automaticamente’. Porém, parece não ser o que ocorre em grande parte.

Existe uma maquiagem em nosso tempo sobre tudo aquilo que parece ser desagradável. Tudo tem que ser bom e agradável. Gostoso para mim. Logo, o Domingo de Ramos não pode nos deixar tristes, mas nos alegrar. Isso também vem acontecendo com outros dias celebrados pelos cristãos, como por exemplo, o dia de finados e em missas de sétimo dia. Porém uma pergunta nós vem: a Vida aceita maquiagem? Para aplacar o sofrimento e a dor basta colocar uma ‘base’ e tudo ficará bem? Não! A vida é intensa nela mesma. Jesus mostrou isso quando chora a morte do amigo morto, ao se angustiar no horto pelo cálice que não poderia ser afastado. E pensemos, o quando não doeu seu coração ao ser beijado pelo seu amigo Judas. Quanta dor sentiu.

O que falta a nós para também sustentar a dor de amor? Será que queremos realmente celebrar o amor com tudo o que ele comporta? Talvez prefiramos a indiferença de um estado de alegria constante. Um mundo das aparências e não da Vida.


O estado observado nas celebrações pode ser sinal – e aqui repetimos ‘pode ser’ – de uma morbidez pseudo-alegre que impossibilita a reflexão e a vivência que os ritos nos levam. 

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