Pastoral e Teologia do “mimimi”: sentimentalismo tóxico


Pastoral é a atividade do cotidiano de uma comunidade cristã visando a implantação do Reino de Deus. É a partir da luta e consolidação de uma comunidade que que ela vai se dando. Refere a um caminhar que, como o pastoreio das ovelhas, todas as vezes o ‘pastor’ realiza o ‘mesmo’ trabalho, dia após dia. Pode-se dizer que é um movimento constante e este pastoreio está aberto, vai ao mundo e deixa o mundo colocar seus desafios. Neste ponto a comparação com o ‘rebanho de ovelhas’ finda, pois não se trata só de um redil. É agora das verdes pastagens aberta a todo o povo.

            Dessa realidade, que sem dúvida é desafiante, nasce um falar de Deus. É a teologia que tenta a partir da experiência de toda uma tradição e, indagada pela realidade, procura dar respostas. A teologia então nasce no ‘caminhar’, ‘no pastoreio’, ‘no meio das ovelhas’. Por isso ela sempre é um desafio e uma construção. Enquanto o povo de Deus caminha ‘uma coluna de fogo vai a sua frente’, porém, é sinal para a grande travessia. A pastoral e a teologia são combates constantes que tem seus momentos de luzes e sombras. Dessa forma, sendo lutas que se dão nessa vida concreta, não cabe a elas serem ansiolíticas ou anestésicas para o ser humano. Muito menos são espécies de autoajuda. Por mais que por elas a esperança passe por pensamentos positivos não se fixa neles, pois dai nada nasceria a não ser uma psicologia do bem-estar. Na prática pastoral e teológica se reconhece a cruz e a ressurreição. O nascimento e as dores do parto. Tudo ao mesmo instante. Ao mesmo tempo que se reza com as dores de muitos, se reza na felicidade de tantos. Amor e dor com elas andam e não se afastam jamais, pois o amor é exigente.

            Em vertentes atuais de comunidades cristãs nasceu o que aqui se chama pastoral do‘mimimi’. Em sua vivência ele não porta a mensagem cristã. Ao contrário, ele a excluí. Podemos dizer que é uma mensagem ‘anticristã’. Nela se percebe claramente a negação do sofrimento e da cruz. Jesus Cristo somente aparece como solucionador de todos os problemas e de contentamento. Nessas comunidades – ou lideranças – tudo tem que ser agradável, doce, bonito, gostoso. Em outras palavras, romântico e infantil. O entretimento, que é uma ocupação sem conscientização, é centro de suas atividades. Jesus Cristo? Somente importa se ele vier recheado de danças, cantos, orações, etc. Mas tudo isso sendo bonito, agradável, soft, light, etc. Ou seja, agradáveis aos ‘telespectadores’. Mesmo a celebração da paixão tem que ser ‘gostosa’, tem que fazer sentir, chorar, etc. O que se busca não é Deus, mas apenas a reação sentimental. Essa é a pastoral e teologia do ‘mimimi’, da infantilização dos fieis em ovelhas bonitinhas e doces. Essa é a religião toxica que se estabeleceu em muitas comunidades.

            Uma das características dessa pastoral é a centralidade no líder religioso – padre, pastor, leigo, etc. Ele é o centro que vai ‘agradar’ as pessoas. E Deus? E o anúncio do Reino? ‘Não vem ao caso’ se não for agradável. Tudo tem que ser bom. Missa ‘de’ criança é um exemplo. Isso mesmo, não é ‘para’ a criança, é ‘de’ criança. Pois nela tem que ter balões, bonecos, teatrinho, crianças pequenas fazendo leituras para que comova toda a plateia – e a Palavra de Deus? ‘não vem ao caso’ se não for ‘gostoso’.   E que tal pipoca, balinha e bolacha na missa e no culto? Oba! Melhor ainda. E na missa de cura e libertação? E se tiver cura, exorcismos, gritos? Também é bom, satisfaz o gosto estético dos participantes.

            O ‘novo anuncio’ – de novo não tem nada pois é doença – coloca as comunidades cristãs em alerta máximo. Pois ele carrega a negação da encarnação, que Cristo veio na carne e assumiu inteiramente a condição humana, levando até as últimas consequências a obediência ao Pai. Não há teologia e pastoral romântica no anúncio do Evangelho. Evidentemente que existes tempos de bonança, partilha, alegria por ser seguidores de Cristo, mas sempre revestidos das armaduras da fé. E armaduras não são para o jardim de infância, de romances, de fantasias, mas para pessoas que tem consciência do grande desafio que Jesus nos chamou.

            Como dito acima, nasce dessa pastoral equivocada uma espécie de teologia – ‘espécie’, mas não é teologia. Ela se dá a partir de líderes formados, padres, religiosos (as), leigos (as), que tratam a mensagem cristã como as ‘autoajuda’ de aeroporto. Dizem coisas bonitas para suavizar as consciências. Transformam a mensagem de Jesus em “Sete passos para o sucesso”, “Como influenciar pessoas...”, “Como sair da depressão...”, “Como ser um grande líder...” E todas as banalidades possíveis de psicologia água com açúcar. Dar as pessoas o que elas querem ouvir é certeza de sucesso. Ou seja, oferta e demanda.  Dessa forma, os desafios colocados pelo mundo a essa teologia não à desafia a dar uma resposta a partir da mensagem cristã, mas pelo contrário, ela se adapta o que o mundo quer, tornando-se perversa.

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